Saturday, June 22, 2013

Entendendo a onda de protestos com a ajuda de José Saramago

Em 1995 José Saramago publicou uma obra-prima, alvo de inúmeras interpretações e análises. Muitos trabalhos e ensaios surgiram associando-a a diversos contextos históricos, então, por que não utilizar suas discussões e abordagens para compreender melhor o momento pelo qual o país passa? O livro conta a história de uma cidade, cujo nome e localização são ignorados , a qual é acometida por uma epidemia de “cegueira branca”. Todos da cidade que passam a enxergar apenas uma brancura de superfície leitosa são isolados num antigo manicômio, onde revelarão todo o seu instinto pela sobrevivência. Apenas uma mulher consegue enxergar normalmente, sendo ela quem lidera um grupo para que fujam do lugar e tentem retornar para um lugar mais seguro, ajudando a todos por toda a história. Mas, no final...

“Há uma luz no fim do túnel”. “A luz da salvação”. “Por favor, me dê uma luz!”. A luz, como sabe-se, branca, está sempre associada a algo bom, que pode conduzir o indivíduo a alguma solução ou a um novo conhecimento. Saramago, entretanto, se utiliza da descrição de um excesso de luz para caracterizar a cegueira com a qual seus personagens são acometidos em “Ensaio sobre a cegueira”. Por que será? Quando se lê o título, espera-se que o autor aborde o tema, dando uma nova ou complementando e fundamentando antigas definições. Mas há uma desconstrução do que é conhecido. O fato é que a sociedade pós-moderna vive bombardeada por informações, imagens. Por inúmeros meios, de diversas formas, a todo o tempo, há uma exposição excessiva ao que ocorre no mundo. Essa iconofagia causa justamente uma verdadeira “cegueira” nas pessoas, que não têm mais tempo para refletir sobre o que é mostrado e estão submetidas a baixa qualidade do que é escolhido como notícia. Exato, estão todos cegos. O que deveria ser conhecimento, passa a ser um meio de manipulação e alienação coletiva. Assim sucedeu-se com as manifestações que tomam conta de todo o país. Um incentivo aqui, um hino nacional ali e pronto: as pessoas estão todas na rua e nem entendem mais o porquê.
Há de se recordar a personagem no livro que não ficou cega. Primeiro, ela tinha um desejo muito grande em manter-se com sua visão pela necessidade de ajudar a um grupo de pessoas que estavam sendo exploradas por um grupo dominante do manicômio; em segundo lugar, justamente seu desejo nobre e o seu pensamento coletivo, pelo bem geral, fez com que ela fosse uma testemunha da degradação humana. Sim, porque em meio à cegueira, não resta nada além de tentar lutar por sua própria sobrevivência, deixando de lado, o respeito, a moral, e convenções sociais. E o que se tem visto nesses últimos dias de protestos? Um grupo dominante (representado pela direita mais conservadora) deixando de lado a Consituição Federal, passando a expulsar e cercear o direito das pessoas se organizarem em partidos e levantar suas bandeiras. E a repressão vem da forma mais desumana que se poderia supor. Outra coisa que se vê no grupo dos “atuais cegos”, é que cada um luta por  seu próprio interesse. Tem quem seja contra a PEC 37 (mesmo que não saiba muito bem que é isso); tem quem queira o fim das bolsas sociais; tem aqueles que querem que o técnico escalte Ronaldinho Gaúcho para a Copa do Mundo; tem quem não queira mais a Copa do Mundo; tem de tudo!

O livro vai mostrando a decadência humana, a qual é representada nos protestos atuais pelos atos violentos e de vandalismo. Não resolve o problema, tampouco se atinge o objetivo. No caso da história deste grande mestre, a meta principal era sair do manicômio e tentar voltar pra casa ou algum lugar mais seguro com comida e um meio mais digno de vida. Só conseguem porque encontram na mulher que enxerga uma líder forte e capaz de ajudá-los a se organizar o suficiente para o seu intento. E, trilhando um caminho árduo, o que representa a busca por um conhecimento mais profundo, chega-se a casa da tal mulher onde ela os ajuda a limpar-se, a comer e superar o trauma, a ponto de um a  um voltar a enxergar. Uma visão otimista para o problema crônico de alienação: tem cura. Procurar ler vários pontos de vista a respeito do mesmo tema, conhecer a história e conhecer a si próprio enquanto ser social, são pontos que ajudam numa percepção mais fiel da realidade e pode ser a cura para a cegueria em massa que toma conta do país. Não é porque a Globo achou legal essa história de abraçar a bandeira do Brasil e cantar como num estádio de futebol que devo também tomar parte. E, voltando à última cena do livro de Saramago, um alerta. Após um a um começar a voltar a enxergar, a heroína, que durante todo o tempo se manteve firme em sua escolha de possuir a visão, passa a ser, ela, a cega. Isso mostra como a cegueira social é também uma fuga. É muito mais fácil seguir a massa, um pensamento de senso comum do que ser diferente, defender minorias, pensar na coletividade e viver de forma coerente com o que se acredita, mesmo que signifique contrariar o que a mídia e o resto da população pensam.

Friday, June 21, 2013

E Drummond diria: O Brasil AINDA está dormindo, coitado...

Por que você veio à rua hoje?
Para ver um Brasil melhor!
A melhor educação! A melhor saúde! A melhor... ah, tudo de melhor!
Para ver um Brasil melhor devemos
Expulsar os partidos?
Acabar com os projetos sociais?
Excluir as classes desfavorecidas?
Sim, e haviam me enganado!
Disseram-me que eu carregasse minha bandeira
Só não disseram que tinha de ser a do time de futebol
E levar corneta
E levar rojão
Ah, sim, estamos na Copa das Confederações!
Encontrei o Policarpo ontem!
Sim, grande filho da nação!
Até ele parecia um pouco assustado
O importante é gritar! Gritar e cantar
As coisas mais vazias e sem sentido que alguém pode dizer
Mas não importa também
A polícia que batia ontem, assiste ao espancamento hoje
O espancamento da liberdade, do entendimento, do movimento
Mo-vi-men-to
Movimento! É uma palavra bonita, desde que no caminho
Não resolvam repentinamente pegar um atalho à direita
E jogar contra o próprio povo...